AS CLASSES PERIGOSAS
O EDUCADOR
José Edmar de Queiroz
Cadernos e livros nas carteiras. Crianças encostadas nas paredes. Meninos de um lado, meninas de outro. No lugar do professor, policiais militares fazendo revista. Não é cena de nenhum enlatado americano nem a ação de nenhuma ditadura africana ou sul americana. Trata-se da mais nova (ou seria velha) estratégia de combate à violência e ao porte de armas nas escolas públicas de Brasília.
Depois de séculos de reflexão sobre a questão pedagógica e das inúmeras tentativas de transformar a escola num lugar agradável para se ensinar e aprender, ela é agora vista como o espaço de manifestação de condutas violentas e se cobra dela colaboração na repressão. Para isso são erguidos muros, grades, instalam-se detetores de metal, câmeras de vídeo e coloca-se a polícia na sala de aula (talvez não tenham entendido bem a afirmação de que a polícia tem de voltar à escola!). É a pedagogia da segurança. Tudo para constatarmos assombrados que a violência não acaba.
O que chama mais atenção é que a escola, espaço de formação e socialização dos mais novos, seja vista hoje como um lugar de perigo. Paradoxalmente, a instituição que é responsável pela transmissão da cultura é encarada como o lugar da barbárie. O que se diz é que os responsáveis (e principalmente as vítimas) por esta violência são os jovens. As estatísticas policiais mostram as armas apreendidas em escolas, as explosões de bombas, o tráfico de drogas. A sociedade clama por uma solução.
A gravidade do problema e o medo que suscita abrem espaço para todo tipo de idéias que vão desde a proibição da venda de armas, passando pela redução da idade para imputabilidade penal até o que nos interessa aqui, a revista das crianças nas salas de aula.
À parte o fato de que precisamos de altenativas ( diria soluções estruturais), é necessário dizer que algumas das idéias em voga são pseudo soluções. Revista na sala de aula não é só pseudo solução é anti-solução.
A entrada da polícia numa sala de aula em uma escola de periferia para revistar crianças, aprofunda entre elas a percepção da escola como um lugar de repressão, um lugar onde não são respeitadas. Além disso, quebra a confiança que os jovens ainda depositam em seus professores, pois estes passam a ser vistos como aliados da repressão. Será que um jovem viciado terá a mesma abertura para uma conversa com a orientadora educacional após a instalação da pedagogia da segurança em sua escola? Ademais, não é novidade a profunda desconfiança que a polícia provoca em muitos jovens de periferia. Seus métodos de ação são muito criticados e os relatos de violência policial são constantes nas salas de aula. Esta desconfiança envolverá também a escola na medida em que ela passa a fazer parte do aparelho policial.
Outra objeção importante à pedagogia da segurança tem origem no seu caráter discriminatório, já que estas operações “Varredura” (é este o nome dado pela polícia) ocorrem em escolas públicas de periferia mas não são levadas a efeito nas escolas da classe média. É a velha ideologia das “classes perigosas” traduzida agora para “classes escolares perigosas”.
A polícia e a escola são duas instituições necessárias numa sociedade democrática, mas paradoxalmente, a importância de uma cresce na proporção inversa à importância da outra. Quando a polícia fica muito importante é porque a escola deixou de sê-lo. Na rua, a polícia é necessária na repressão às armas e crimes. Na sala de aula, o professor cumpre sua função milenar de transmissão da cultura, da civilização e da paz. A pedagogia da segurança é um erro porque transforma a escola no lugar onde os jovens são reunidos para serem controlados, quando deveríamos colocá-los juntos para educá-los. A polícia entrar na sala de aula é como o general entrando no parlamento para fechá-lo
O problema é grave, mas não nos iludamos com soluções fáceis, pois em geral o preço pago por elas é muito grande para suportarmos. Nunca é demais lembrar que os EUA, uma das sociedades que mais reprime a criminalidade inclusive nas escolas, é uma das mais violentas e suas instituições educacionais não são “lugares seguros”. Basta ver as chacinas que ocorrem nas escolas americanas para perceber que não temos a obrigação de copiá-los. Tudo leva a crer que estamos fazendo concessões demais à ideologia da segurança e todas as vezes que as sociedades fizeram isto o preço foi muito alto: a perda da liberdade.
Criminalizar as crianças não é a melhor alternativa, tampouco colocar a polícia na sala de aula, pois os jovens vão encontrar outras maneiras para resolver seus conflitos se não os ensinamos a lidar com eles através da palavra. A escola não é a solução nem o principal locus da violência urbana, mas pode proporcionar, através de um processo pedagógico lento, um espaço para que as crianças e jovens se armem dos instrumentos da cultura indispensáveis para saírem da sua condição de inferioridade social e em alguns casos de violência. Os educadores não podem tirar armas da cintura dos jovens, mas podem ajudá-los a tirá-las da cabeça.
A pedagogia da segurança não resolve e ainda cria mais um problema para a escola que é o do esgarçamento da confiança entre professores e alunos. Enfim, é preciso gritar em alto e bom som que a escola deve ser um lugar livre da violência, mas também não pode ser um caso de polícia. Mãos ao livro, crianças!
José Edmar de Queiroz
Depois de séculos de reflexão sobre a questão pedagógica e das inúmeras tentativas de transformar a escola num lugar agradável para se ensinar e aprender, ela é agora vista como o espaço de manifestação de condutas violentas e se cobra dela colaboração na repressão. Para isso são erguidos muros, grades, instalam-se detetores de metal, câmeras de vídeo e coloca-se a polícia na sala de aula (talvez não tenham entendido bem a afirmação de que a polícia tem de voltar à escola!). É a pedagogia da segurança. Tudo para constatarmos assombrados que a violência não acaba.
O que chama mais atenção é que a escola, espaço de formação e socialização dos mais novos, seja vista hoje como um lugar de perigo. Paradoxalmente, a instituição que é responsável pela transmissão da cultura é encarada como o lugar da barbárie. O que se diz é que os responsáveis (e principalmente as vítimas) por esta violência são os jovens. As estatísticas policiais mostram as armas apreendidas em escolas, as explosões de bombas, o tráfico de drogas. A sociedade clama por uma solução.
A gravidade do problema e o medo que suscita abrem espaço para todo tipo de idéias que vão desde a proibição da venda de armas, passando pela redução da idade para imputabilidade penal até o que nos interessa aqui, a revista das crianças nas salas de aula.
À parte o fato de que precisamos de altenativas ( diria soluções estruturais), é necessário dizer que algumas das idéias em voga são pseudo soluções. Revista na sala de aula não é só pseudo solução é anti-solução.
A entrada da polícia numa sala de aula em uma escola de periferia para revistar crianças, aprofunda entre elas a percepção da escola como um lugar de repressão, um lugar onde não são respeitadas. Além disso, quebra a confiança que os jovens ainda depositam em seus professores, pois estes passam a ser vistos como aliados da repressão. Será que um jovem viciado terá a mesma abertura para uma conversa com a orientadora educacional após a instalação da pedagogia da segurança em sua escola? Ademais, não é novidade a profunda desconfiança que a polícia provoca em muitos jovens de periferia. Seus métodos de ação são muito criticados e os relatos de violência policial são constantes nas salas de aula. Esta desconfiança envolverá também a escola na medida em que ela passa a fazer parte do aparelho policial.
Outra objeção importante à pedagogia da segurança tem origem no seu caráter discriminatório, já que estas operações “Varredura” (é este o nome dado pela polícia) ocorrem em escolas públicas de periferia mas não são levadas a efeito nas escolas da classe média. É a velha ideologia das “classes perigosas” traduzida agora para “classes escolares perigosas”.
A polícia e a escola são duas instituições necessárias numa sociedade democrática, mas paradoxalmente, a importância de uma cresce na proporção inversa à importância da outra. Quando a polícia fica muito importante é porque a escola deixou de sê-lo. Na rua, a polícia é necessária na repressão às armas e crimes. Na sala de aula, o professor cumpre sua função milenar de transmissão da cultura, da civilização e da paz. A pedagogia da segurança é um erro porque transforma a escola no lugar onde os jovens são reunidos para serem controlados, quando deveríamos colocá-los juntos para educá-los. A polícia entrar na sala de aula é como o general entrando no parlamento para fechá-lo
O problema é grave, mas não nos iludamos com soluções fáceis, pois em geral o preço pago por elas é muito grande para suportarmos. Nunca é demais lembrar que os EUA, uma das sociedades que mais reprime a criminalidade inclusive nas escolas, é uma das mais violentas e suas instituições educacionais não são “lugares seguros”. Basta ver as chacinas que ocorrem nas escolas americanas para perceber que não temos a obrigação de copiá-los. Tudo leva a crer que estamos fazendo concessões demais à ideologia da segurança e todas as vezes que as sociedades fizeram isto o preço foi muito alto: a perda da liberdade.
Criminalizar as crianças não é a melhor alternativa, tampouco colocar a polícia na sala de aula, pois os jovens vão encontrar outras maneiras para resolver seus conflitos se não os ensinamos a lidar com eles através da palavra. A escola não é a solução nem o principal locus da violência urbana, mas pode proporcionar, através de um processo pedagógico lento, um espaço para que as crianças e jovens se armem dos instrumentos da cultura indispensáveis para saírem da sua condição de inferioridade social e em alguns casos de violência. Os educadores não podem tirar armas da cintura dos jovens, mas podem ajudá-los a tirá-las da cabeça.
A pedagogia da segurança não resolve e ainda cria mais um problema para a escola que é o do esgarçamento da confiança entre professores e alunos. Enfim, é preciso gritar em alto e bom som que a escola deve ser um lugar livre da violência, mas também não pode ser um caso de polícia. Mãos ao livro, crianças!
José Edmar de Queiroz
Enviado por e-mail Yahoo pelo Professor Gabriel Costa < Gaco Costa"
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