domingo, março 04, 2007

MULHER AO ESPELHO - Cecília Meireles


MULHER AO ESPELHO (MAR ABSOLUTO- 1945)

"... Essas mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o efêmero e o eterno".
Cecília Meireles


Mulher ao Espelho
(publicado em Mar Absoluto, de 1945)


Hoje, que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.
Já fui loura, já fui morena,
Já fui Margarida e Beatriz,
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.
Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?
Por fora, serei como queira,
a moda, que vai me matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.
Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.
Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.


Tudo isso me lembrou você Martha.
Dedico esta poesia de Cecília Meireles pela passagem do dia Internacional da Mulher e pela extraordinária mulher que és.

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