domingo, janeiro 10, 2010

Lula, um filho do Brasil


FONTE: http://www.defato.com/crispiniano.php

 

Lula, um filho do Brasil

Há menos de 48 horas, assisti ao filme "Lula, o filho do Brasil".
Essa é uma obra que a gente vê com algumas ideias prévias, porque nunca, na história,
se falou tão mal de um filme. Nos jornais, na tevê, nas revistas, antes da estreia o filme que não conhecíamos era propaganda eleitoral, vigarice, com uso desonesto da máquina pública.
Hoje, nos jornais, o filme mudou para a categoria de obra medíocre, indigna de ser vista.
Nos textos e chamadas vem agora a mensagem que não é mais subliminar: "Grande público, corra desse filme". Sabemos todos quanto os meios de comunicação prezam a inteligência e sensibilidade humana.
Então o colunista, que faz parte desse grande público, concluiu: se falam tão mal e com tamanha insistência, a obra tem valor. E por isso fui e vi.
Já no começo, há um choque no peito que toma conta da gente enquanto vê as cenas:
terra seca, brasileiros partindo de pau-de-arara rumo a uma tentativa de vida melhor. Como tantos e muitos outros até hoje, poderia ser dito, é certo, mas com a diferença, e aí é que vem o maior choque, o saber que um desses brasileiros partiu da carência de tudo para chegar a ser o presidente mais popular do mundo. É como se fosse uma fábula real.
Melhor: é uma fábula verdadeira, é um Andersen de final feliz, o patinho menos que feio se transformar em muito mais que um cisne. Mas então a gente pigarreia, espanta a emoção e cai em outras imagens comoventes.
Em conceitos moventes, que movem toda a gente. Por exemplo, as ideias dos pobres na crença do valor do trabalho. Em um tempo de tanta sacanagem, como são bem-vindas essas lições/ideias.
Há uma cena irresistível, quando o Lula adolescente suja com óleo o macacão limpo
para se exibir à vizinhança e à mãe. Eu sou um trabalhador, mãe. Eu agora sou gente. Ela sorri.
E vem crescendo com ele, a partir daí, até ser ultrapassada pela vida do rebento, a pessoa dessa mãe.
Ela, ali como aqui, ali como em todo lugar, é uma fundadora de personalidade. No entanto, não existe apelação, apelo sentimental, sentimentalismo em "Lula, o filho do Brasil".
Os olhos mais críticos já fizeram a justa observação de que o filme é desprovido de ritmo
ou tensão dramática. Ou seja, nele não há um conflito básico, ou conflitos cruciais desenvolvidos à emoção veloz ou com paciência multiplicados. Nem mesmo, o que seria propaganda pura, mas dentro da "gloriosa" tradição de Hollywood, o heroi sozinho contra o resto do mundo, o self-made-man típico, que se faz só. É inesquecível a cena do discurso no estádio, quando um alto-falante coletivo é construído pela multidão de sindicalistas, que gritam em sucessivas ondas um discurso.
No filme não há tampouco o cara de moral incorruptível. Pelo contrário, em mais de uma oportunidade, vemos a sobrevivência esperta a favor do humano. Assim, um filho mente para o pai analfabeto, e escreve o contrário da vontade do pai, quando escreve à mãe que venha para São Paulo. ("Venha para não morrer", sabemos.) Ou quando Lula, um secretário do sindicato, usa de toda a argúcia para ganhar o coração da mulher por quem está apaixonado.
É verdade que em mais de uma ocasião a gente vê o personagem Lula transbordar das imagens, porque sabemos algo de sua história e importância. Então sentimos, percebemos o personagem ir além das margens extremas da tela. Isso não se dá só pela duração do filme, pela quantidade de anos de vida selecionados - isso se faz pelos momentos essenciais que ficam ocultos.
As coisas mais cruas e duras são omitidas. Por exemplo, quando o Lula menino pegou da boca de um colega o chiclete mascado. Por exemplo, quando bebeu da água que até os animais rejeitam. Ou a intensidade da dor de ver a mulher falecer de parto, como tantos pobres do Brasil já viram e jamais tiveram a sua dor expressa.
É horrível o esquemático - o corte de qualquer filme na construção de um personagem gera insatisfação. Os recursos com que a literatura conta não sobrevivem na cirurgia da montagem. Pior, a escolha nem sempre é a mais sensível, onde cortar, onde avultar, onde crescer.
Lula, o personagem, sabemos todos, é maior que o PT, é bem maior que o sindicalismo,
porque ele vem com a força da história, como uma encarnação da força que o povo tem. Dos muitos Severinos, Joões, Marias e Lindus. No fim do filme, na imagem imóvel da posse presidencial, ouvimos Luiz Gonzaga.
Então nos levantamos, muito contra a vontade, com uma certeza: toda a luta, a luta toda valeu a pena.
"Só trazia a coragem e a cara, viajando num pau-de-arara", ouvimos.

 
Copiado do Jornal de Fato Coluna Prosa & Verso de Crispiniano Neto Domingo 10/01/2010 http://www.defato.com/crispiniano.php




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