terça-feira, janeiro 23, 2007

ENTRE PAI E FILHO

ENTRE PAI E FILHO

CLAUDER ARCANJO
Extraído do Jornal Gazeta do Oeste coluna Questão de Prosa

Conversa entre pai e filho, em um lar qualquer de nossas cidades.
- Oi, pai! Tudo bem com o senhor?
- Só um pouco cansado, filho. Hoje foi um dia daqueles no escritório. Ligue a tevê para vermos o noticiário.
- Certo pai.
“ Boa noite, caros telespectadores.
Mais uma denuncia de corrupção, envolvendo desta vez, outros membros da máquina pública...
Mais detalhes do escândalo do ministério...
Novos depoimentos sobre o mensalão dos deputados...
Continuam as prisões de empresários que desviaram dinheiro do fisco...”
- Filho desligue isso!
- Sem problemas pai. Mas preciso conversar com o senhor.
- Vamos para o meu quarto. Enquanto tiro esta roupa e tomo um banho, a gente conversa.
- Pai, o que você esta achando disso tudo? É corrupção para todos os lados. Todo dia pipoca um caso novo.
- É verdade Filho. A situação é preocupante.
- Esse país não tem jeito, pai?
- Não é bom ir por aí, filho. Existe muita gente séria, pessoas que trabalham e labutam dignamente, Não podemos generalizar.
- Hoje, na escola, um dos meus amigos me disse que não vale a pena estudar, pois, no final, o que vale na vida é o Q. I., ou seja, o quem indica.
- Hum!... Hum!...
- Fiquei meio calado, não queria discutir. Tinha estudado muito na noite anterior, e teríamos uma prova super-difícil após o intervalo. Mas aquilo mexeu comigo. Entramos na sala de aula, passamos a responder a avaliação e vi, pelo canto do olho, um dos alunos colando descaradamente. O professor, percebi que ele viu, ficou fingindo naturalidade. Isto é certo, pai? Depois, o que colou ainda gozou com a minha cara, me chamando de babaca.
- Hum!... Hum!...
- A vida é assim mesmo, pai, dos espertos?... Você me diz uma coisa e o mundo só me mostra outra.
- Mas, meu filho. Não se constrói um futuro baseado na trapaça, no jeitinho, na cola. Continue firme, não se deixe levar pelo canto fácil. Lembre-se, isso é vitória de Pirro.
- E a atitude do professor, do mestre, como você sempre insiste que eu o chame? Não é ele o responsável por nossa educação? Se omitindo, ele não deseduca? A escola, o nosso segundo lar, segundo suas palavras, não está errado também, pai?
- Hum!... Hum!...
- Pior é que as garotas estão me chamando de besta, quando passo a defender os pontos de vista que você sempre procurou me repassar. A decência, a seriedade no trato da coisa pública, o respeito com os outros, principalmente com os mais simples e desvalidos, a educação como verdadeira mola para a construção de um novo futuro...
-Hum!...Hum!...
- E quando se lê um jornal, uma revista, assiste a um noticiário, uma montanha de escândalos com os nossos políticos. Pessoas, segundo você próprio me ensinou, responsáveis por buscar o bem-comum. Mas que só andam se locupletando, roubando, extorquindo. Semana passada, a policia matou cidadãos numa emboscada. Já não se sabe que é mais marginal, pai!

- Filho escute! A solução não esta em desistir. Nada de se deixar levar por essa onda de pessimismo, isso não ajuda. Precisamos, como nunca, de todos. A sociedade é a união, formada por cada um de nós. Mudando, mudaremos o todo. Se nos entregarmos, a coisa piora. O homem é um ser histórico, podemos alterar o que esta aí, construindo um amanhã melhor. Pense nisso! Por seus filhos, por meus netos.
- Pai!... Quando fui dizer que você me ensinou tudo isso, hoje na escola, um dos alunos chamou o senhor, desculpe a expressão, de babaca, de trouxa. Pela primeira vez, briguei no colégio, pai.
-...

Extraído do Jornal Gazeta do Oeste coluna Questão de Prosa

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