sexta-feira, julho 20, 2007

JOVEM GÊNIO DO XADREZ

JOVEM GÊNIO DO XADREZ

Por David Lhada

Magnus Carlsen, superdotado e de uma família humilde, converteu-se aos 16 anos na maior atração do circuito mundial.

Já não se pode falar de uma jovem promessa, mas de uma figura consagrada. O norueguês Magnus Carlsen, de 16 anos de idade, assombra igualmente a experimentados e a profanos com sua fenomenal atuação no torneio de xadrez de Linares-Morelia, considerado o Wimbledon do xadrez.

A organização desta prova, cuja seleta lista costuma estar restringida aos oito melhores ases do tabuleiro, decidiu este ano abrir as portas à participação do prodígio norueguês, apesar de sua classificação no ranking internacional, onde ostentava "somente" o posto número 24, no início do ano. Foi uma iniciativa muito aplaudida, mas poucos teriam se atrevido a pressagiar algo melhor para Carlsen do que um lugar nos últimos postos da tabela, com uma pontuação mais ou menos honrosa. Sua liderança, que assumiu na primeira rodada e que manteve até a conclusão da primeira volta, pegou de surpresa inclusive os mais otimistas, desatando uma autêntica carlsenmania.

É precisamente o que precisava o xadrez, um esporte que vive do "puxão" das grandes figuras e que se encontrava vazio de referências desde o ocaso de Fischer, Karpov e Kasparov. Grandes lendas do "boxe mental", cujas conquistas juvenis ficam reduzidas quando se comparam com as de Carlsen. Apesar de iniciar-se no xadrez relativamente tarde, com oito anos, seu fulgurante progresso o levou a converter-se logo num jogador de primeira linha, e aos 13 conquistou uma vitória diante do campeoníssimo Anatoly Karpov. Nem o fato de ter que medir-se na próxima rodada com "o rei" Kasparov nas semifinais impediu que Carlsen dormisse calmamente essa noite durante doze horas. No dia seguinte, arrancou um empate do melhor jogador do mundo na primeira partida entre ambos, ainda que um erro lhe custasse a derrota na segunda. "Joguei como um menino!", lamentou-se, para assombro de uma audiência que opinava precisamente o contrário.

Por trás destes sucessos está a história de um pai, Henrik Carlsen, que sempre procurou uma forma de estimular intelectualmente seus filhos desde muito cedo e que logo compreendeu que o sistema educativo convencional não seria mais do que um estorvo para um menino especialmente dotado: aos cinco anos, sabia de cor a extensão, a população, a bandeira e a capital de todos os países do mundo, só para dar um exemplo de suas aptidões.

Em 2003, Magnus deixou de ir ao colégio e se dedicou inteiramente a competir em torneios. Esta decisão foi motivo de críticas dos que opinavam que seus pais estavam sacrificando sua educação para convertê-lo em uma máquina de jogar ao xadrez. Mas nada estava mais longe da realidade: "O plano de meus pais sempre tinha sido tomar um ano livre para viajar e mostrar o mundo a seus filhos. Assim, esse ano foi uma boa oportunidade para fazê-lo", conta Magnus.

Para cumprir esse objetivo, a família não mediu sacrifícios. Venderam seu segundo carro, colocaram toda sua bagagem e os livros escolares no veículo familiar e alugaram sua casa por um ano, para poder custear as viagens. Assim percorreram todo o continente, num longo périplo que os levou da Noruega a Europa do Leste, sempre de torneio em torneio e de museu em museu.

"Não senti falta da escola. Não aprendo muito durante as aulas normais; é mais efetivo quando meus pais me ensinam. Por certo, entendo o problema de um professor que tem que atender a 30 alunos, mas para mim é frustrante e me sinto pouco estimulado por estar a maior parte do tempo esperando. Faz-me perder a motivação", explica Carlsen, com uma maturidade surpreendente. Agora, convertido numa estrela do xadrez, e tendo atingido uma equilibrada formação intelectual e emocional, não cabe senão aplaudir o acertado daquela arriscada jogada que supôs pôr em xeque os convencionalismos educativos.

Novembro de 1990: Nasce em Lommedalen, Bærum, bairro suburbano de Oslo.

Fevereiro de 2004: Com 13 anos, derrota o ex-campeão mundial Anatoli Karpov em um torneio; no dia seguinte, nas semifinais, consegue o empate em sua primeira partida frente a Garry Kasparov, que ostentava nesse momento a primeira posição do ranking internacional.

Abril de 2004:Consegue o título de Grande Mestre de xadrez, com 13 anos, 4 meses e 26 dias; o segundo mais precoce da história.

2004: Vê publicada a primeira biografia sobre sua vida, "Wonderboy", escrita por seu treinador e traduzida imediatamente para vários idiomas.

2005: Obtém sua classificação para a fase final do Campeonato do Mundo; é atualmente o aspirante ao título mais jovem nos cinco séculos de história do xadrez.

2007: Ainda que oficialmente ocupe o 24º posto do ranking internacional, é convidado excepcionalmente a tomar parte no torneio de Linares-Morelia, geralmente reservado aos 8 melhores enxadristas do mundo. Magnus surpreende liderando a prova, ao término da primeira volta.




[Contracapa do Diário "El Mundo"]

Originalmente publicado na contracapa do diário "El Mundo" e no blog pessoal do autor.
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(Tradução: Anderson de Jesus)

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